segunda-feira, 3 de maio de 2010

Fábula do grande homem

   Um certo homem sentia-se fortemente pungido pela desolação. Isso porque há muito havia percebido que os homens os quais conhecia chegavam até ele pequenos, ingênuos, ignorantes e obtusos; mas depois, conforme a amizade se estreitava, tais homens iam se tornando cada vez maiores, mais experientes, mais conhecedores, com horizontes mais amplos e capazes de raciocínios mais argutos e sofisticados. Tal homem, então, invejava a rápida ascensão e o grande progresso desses amigos, ao passo que notava que com ele o mesmo não acontecia, nenhuma grande modificação se operava em sua inteligência e em sua sabedoria. Certa noite, esse homem, enquanto buscava esquentar-se do imenso frio de seu espírito junto a uma fogueira e contemplava, com melancolia, as chamas a sua frente, tendo os olhos umidecidos por lágrimas, ouviu o fogo lhe falar: Por que sofres, oh grande homem? Não te apercebes que também eu nunca ganho mais calor do que sempre tive, ainda que tudo o que de mim se aproxima, chega a mim mais frio e, gradativamente, torna-se mais quente? Como poderia eu, que sou quente por natureza, querer aquecer ainda mais? Saiba que não há deus que não conheça o teu pesar e que todos eles lhe acariciam o rosto e lhe enxugam as lágrimas! Contenta-te, oh grande homem, em, assim como eu, ser a fonte de onde irradia aquilo que para os que se chegam junto de nós, lhes faz falta. E, sobretudo, conserves na memória a lembrança de que sempre que teus amigos partirem abundantes do que antes careciam, foi em ti que eles se fartaram! E nessa lembrança encontrarás a plenitude e a satisfação daqueles que são aquilo que são em virtude de sua própria natureza.

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